sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Tudo!

E que tal o texto do David Coimbra?!





Natan era o típico canastrão. Aproximava-se das mulheres sempre ronronando, sempre com um sorriso enviesado, sempre com uma sobrancelha levantada. Fazia algum sucesso porque era meia-esquerda (todos sabem que os meias-esquerdas fazem sucesso com as mulheres). E se gabava disso. Vivia falando de suas conquistas, dizendo que era gostoso.
– Sou totoso… – se vangloriava.
Tríssia o odiava.
Tríssia era uma mulher sofisticada. A psicóloga do clube. Alta, morena clara, ela não andava; deslizava pelo mundo a um palmo do chão. Jamais levantava a voz, jamais fazia um gesto brusco, jamais se alterava. Era uma rainha. Por isso detestava aquele falastrão.
Natan sentia a repulsa de Tríssia e se mantinha à distância. Até porque Tríssia não dava confiança a homem nenhum. Nenhum! Tríssia não precisava de homens. Tríssia era soberana. 
Mas um dia ela foi ao clube de minissaia.
Tríssia jamais usava minissaia no trabalho, mas naquele dia fazia calor, ela se sentia bem, sentia-se sensual e
bela e algo ousada. Pulou dentro de uma minissaia negra como seus cabelos e foi, ondulando de cima de suas pernas compridas e apessegadas.
Natan viu. Foi como se tivesse engolido um paralelepípedo. Ficou entre angustiado e emocionado. Tomou uma decisão. Pela primeira vez, entrou no gabinete de Tríssia. Abriu a porta num repelão. Ela estava parada ao lado de um armário. Levou um susto.
– O que foi? – espantou-se ela, levando a mão ao peito.
Natan se aproximou gingando. Estava sério como Tríssia jamais vira. Olhava-a nos olhos. Ela recuou. Bateu com as costas no armário.
– Que foi? – repetiu, cada vez mais assustada.
Ele chegou bem perto. Parou a centímetros do rosto dela. Olhou-a de baixo para cima, olhou-a bem, olhou-a toda. Respirou fundo, como se sorvesse seu cheiro. E disse, enfim, num gemido rouco:
– Vou fazer… “tudo”… contigo.
Frisou aquele “tudo”. Aquele tudo explodiu na boca de Natan e reboou no ouvido de Tríssia. Ela arregalou os olhos. Sua surpresa foi tamanha que não conseguiu sequer reagir. Nem teve tempo: Natan já havia lhe dado as costas e saíra para o treino.
Só depois de passado o assombro é que a indignação tomou conta de Tríssia. Mas aquele tipinho era mesmo um abusado, um convencido, um desavergonhado. O que ele estava pensando?
O incidente abalou a manhã de Tríssia. Ela marchava de um lado para outro do gabinete, fula. Ao meio-dia, foi almoçar com Lívia, a secretária do Departamento de Futebol. Desabafou:
– Tu acreditas que o Natan entrou no meu gabinete e disse que ia fazer tudo comigo?
Lívia parou de comer:
– Ele disse? Tudo? Disse mesmo?
– Disse. Bem assim: “Tudo”.
– Aiai…
Tríssia arregalou os olhos:
– Que quer dizer esse suspiro?
– Aiai…
– Lívia! Tu e aquele canalha? Não acredito!
– Tudo… Aiai… Tudo…
– Lívia!
Mas Lívia estava fora do ar, e fora do ar ficou até o final do almoço. Tríssia voltou para o trabalho intrigada. Quando passava pelo pátio, Natan passou por ela. Ciciou, mais com os lábios do que com a voz, a cara de cafajeste reluzindo de lascívia:
– Tudo…
E se foi para o campo outra vez. Tríssia estava irritada com aquela situação. Entrou no gabinete e encontrou Luciana, a mulher do presidente do clube.
– Que aconteceu? – perguntou Luciana. – Tu pareces braba.
– E estou! Aquele Natan! Aquele ridículo!
– Que é que tem?
– Deu para dizer que vai fazer tudo comigo!
Luciana deu um gritinho. E a agarrou pelos ombros:
– Não! Ele disse tudo?
– Isso: tudo – Tríssia estava perplexa.
Que reação era aquela da mulher do presidente?
– Meu Deus! Tu és uma mulher de sorte.
– Lu!
Lu não respondeu. Saiu do gabinete, afogueada, repetindo: mulher de sorte, mulher de sorte, tudo, tudo…
Tríssia passou o resto do dia perturbada. Foi para casa pensando naquilo: tudo, tudo. O que seria “tudo”? Por volta das dez da noite, a campainha soou. Ela foi atender. Abriu a porta, e lá estava ele. Natan. Olhava-a em silêncio. Uma sobrancelha erguida. O sorriso de lado. Por algum motivo, Tríssia não se surpreendeu. Apenas o puxou pela mão e o levou para o quarto. Ia resolver aquilo de vez. Vinte minutos depois, ele abotoava a camisa, preparando-se para ir embora. Tríssia, frustrada, reclamou:
– Isso é “tudo”? Tudo? Por favor!
Ele, da porta:
– Beibe, você ainda não está preparada para “tudo”.
E foi embora.



Extraído do Blog do David Coimbra

Nenhum comentário:

Postar um comentário